Poucos ódios são tão declarados e viscerais quanto o que sentem os mais cristãos contra os homossexuais.
Estapafúrdias figuras, esses pregadores de ego ptolomaico e voz rasteiramente confortante que com uma mão levantam a bíblia e com a outra batem à mesa cuspida acidentalmente pelos brados coléricos que falam insistentemente da “vontade de Deus”.
Não se dão conta, mas seus argumentos levam à conclusão que, em Sua magnificência e poder, Ele haveria de ser o responsável por tudo, pela existência das flores, das estrelas e, da mesma maneira… dos homossexuais.
Aliás, os santos padres também são criação de Deus, mesmo os menos santos deles. E isso nos leva a perguntar, afinal, que linhas tortas são essas com que Deus escreve a história de milhares e milhares de crianças abusadas sob o teto das igrejas, vítimas daqueles que falam em Seu nome?
Uma investigação apresentou o inacreditável número de 330 mil casos de pedofilia na igreja católica desde 1950. No mundo? Não. Esse números são apenas na França. Em Portugal, o registro oficial é de quase 5 mil crianças abusadas por clérigos no mesmo período.
Que divina matemática é essa que chega à conclusão de intervir contra o amor verdadeiro e recíproco de dois adultos e permite a metástase da pedofilia no corpo da igreja?
Não se enganem. Quando séculos se arrastaram e a decisão histórica da igreja foi esconder os abusos e estupros de crianças, isso é permissão.
Quando por 20 anos o cardeal Ratzinger, Papa que antecedeu Francisco, foi o encarregado de zelar pela obediência aos termos do “Crimen Sollicitationis”, documento secreto enviado aos bispos do mundo inteiro que os orientava a manter sigilo, remanejar os algozes de menores e ameaçar delatores de excomunhão, isso é permissão.
Quando, na tentativa de resguardar os velhos alicerces da igreja, esta fez o possível para que os recorrentes casos fossem vistos como fatos isolados, isso é permissão.
Permitamo-nos, pois, a heresia de atestar que o grande e evidente defeito de Deus são seus interlocutores; esses pedantes misóginos; esses pedófilos acobertados pelo manto da leniência; esses canalhas que fazem fortunas catedráticas da aspereza da vida alheia e condenam multidões a confiar-lhes cegamente a palavra, mesmo que esta seja de ódio; esses pastores deputados que fazem de tudo para desviar o País do caminho inevitável e natural e lutam contra os direitos mais elementares, entre eles o casamento entre homossexuais.
É por isso que, por enquanto, o único gay que tem permissão para casar no Brasil é mesmo o padre. Casar os outros.
Não tarda o dia, porém, em que olhares apaixonados e comoventes hão de se cruzar cintilantes quando o sacristão disser essas doces palavras:
“Eu vos declaro marido e marido”.