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Permito-me

“Esse evento, porém, foi resultado de negligência à minha saúde mental e o início de uma longa luta contra o transtorno de ansiedade.”

Há pouco mais de 4 anos, eu tive um ataque de pânico.

Fui parar no hospital com o coração quase saindo pela boca, à beira de um colapso. 

Fui medicado. Exames foram feitos. Não encontraram nenhum sinal de preocupação. Quer dizer, nenhum sinal físico. 

Ao me liberar, o médico disse do que se tratava. Lembro que fui para casa achando que o problema já havia passado. 

Esse evento, porém, foi resultado de negligência à minha saúde mental e o início de uma longa luta contra o transtorno de ansiedade. 

Somente este ano recebi alta definitiva. A minha sorte é que eu procurei ajuda imediata e tinha a meu lado alguém para me entender e me ajudar, a minha esposa. 

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O que mais me causou surpresa no início foi a reação das pessoas. Algo entre incompreensão e desdém sempre esteve presente no silêncio e nos comentários jocosos dos familiares e amigos mais próximos. 

Eu sempre fui muito transparente, ingênuo até, e nunca vi problema em me abrir, falar de meus planos e sonhos. Demorou para eu aprender a ficar calado, e confesso que de vez em quando ainda cometo deslizes de sincericídio.

De qualquer maneira, o fato é que, contando minha experiência, eu desarmava os outros. Foi então que descobri um universo de pessoas que, por vergonha, sofria em silêncio. 

Amigos próximos, pessoas do meu convívio diário, não tiveram a sorte e a iniciativa que eu tive. Em especial os homens, todos eles ensinados a esconder seus sentimentos e falhas sob pena de ridicularização. 

Ouvi relatos de meses sem dormir, crises e desespero. Eu mesmo experimentei a negação inicial e um sentimento de fraqueza que espezinha. 

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Lembro de comentar, uma vez, que se eu tivesse quebrado uma perna, todos saberiam entender o problema, seriam capazes de ter empatia e estariam dispostos a dizer algo positivo. 

Como quebrei algo intangível, porém, como não havia uma ferida palpável e mensurável, quase ninguém era capaz de perceber, portanto, qualquer dor. 

E o que mais me incomoda hoje é ter a consciência de que todas essas reações alheias que tanto julguei ruins ou impróprias não eram traço de personalidade ou jeito de ser. Esses somos nós, estruturalmente. 

Olhando para trás, vejo que eu mesmo já fui desdenhoso sobre essas questões. Eu já me julguei invencível a tais problemas. Eu já agi, inadvertidamente, para manter a saúde mental como tabu. 

Permito-me, agora, fazer o contrário. 

Dário Castro

Escritor, Jornalista e Mestre em Estudos Culturais.
Contato: [email protected]

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